Rodrigo
Vignoli tenta conciliar os extremos encarnando-os simultaneamente. Um
experimentador em busca do sublime de cada ato.
Magick
(Entrevistador): Quando e onde conheçeu o método de Sigilos Mágickos?
Rodrigo
Vignoli (Entrevistado): Eu
fui apresentado à magia de sigilização em 2009, quando era um cético de tudo e
trabalhava à noite num restaurante como garçom. Na época eu era apenas um
adolescente inconsequente e descrente de tudo, a "fase problema". Um
colega de trabalho um dia me propôs que poderia colocar a minha descrença em
cheque e me disse que eu era "digno de saber" algumas coisas. E me
apresentou a proposta.
Eu
era cético, mas não era ignorante. Gostava de desafios, de testar a situações,
experimentar coisas novas, então me rendi ao processo de leitura e entendimento
e fiquei realmente impressionado em como a técnica funcionava. Eu estava diante
de um mecanismo de produção de causas-e-efeitos e sem ter como chamar aquilo de
"coincidência".
Foi
um dos meus primeiros abismos da consciência, ceder ao Desconhecido e buscar
entender como funcionava tudo isso. Naquele momento um universo inteiro se
abriu diante de mim e eu ainda não tinha percebido que para usufruir daquilo
que me era ofertado eu teria que abandonar qualquer ceticismo, descrença,
pré-conceito ou crítica não fundamentada. Mas o Caos tem suas maneiras de nos
ensinar tudo aquilo que precisamos aprender, e ele faz sempre do jeito certo,
não importa qual seja.
M:
Qual(is) método(s) de criação de Sigilos Mágickos você já utilizou?
R:Quando eu comecei a utilizar a técnica
de sigilização eu costumava empregar sempre afirmativas e de uma forma
objetiva. Elaborava uma frase, geralmente começando por "Meu desejo
é..." e depois cortava as vogais, deixando apenas as consoantes e
elaborando um glifo específico o qual eu o energizava.
Já
me vali de diversos métodos para atingir estado de gnose, desde orgasmos até
tonteira, exaustão e medo, por exemplo.
Atualmente eu prefiro ser mais simplista, apenas concentrando no intuito e traçando símbolos correlatos até criar aquilo que me apetece. Mesmo para energização tenho preferido a praticidade como o processo de concentração e foco na figura até atingir o limiar da supraconsciência e lançar a Vontade no Todo.
Atualmente eu prefiro ser mais simplista, apenas concentrando no intuito e traçando símbolos correlatos até criar aquilo que me apetece. Mesmo para energização tenho preferido a praticidade como o processo de concentração e foco na figura até atingir o limiar da supraconsciência e lançar a Vontade no Todo.
Acho
que sigilo acaba sendo algo muito pessoal e encontrar a técnica ideal demanda
experimentações diversas.
M:
Em "Pop Magic!", Grant Morrison, declara: "Eu venho os usando
[Sigilos] por vinte anos e eles SEMPRE deram certo.". Comente essa frase.
R:
Eu vejo muita gente
discutindo quais são os fatores para um sigilo funcionar. Gente que diz que os
sigilos funcionam parcialmente; ou que funcionam, mas não no devido prazo; ou
que alguns sigilos funcionam e outros não.
Eu
sempre tive 100% de sucesso em todos os meus sigilos, mas devo dizer que não me
esgoto em tentativas. Eu conheço magistas que fazem sigilos para toda e
qualquer situação, eles querem remodelar toda a realidade com sigilos, e eu
acho que isso é possível, só não acho que seja saudável.
O
sigilo atua dentro de um contexto, ele precisa de um impulso magnético do
aplicante para lhe dar força e então ele se vale da situação vigente para
manifestar a intenção sintetizada. Você pode ter situações que estão de acordo
com o seu Caminho, o seu desenvolvimento, aquilo que Crowley vai chamar de
Verdadeira Vontade e o Cristão vai chamar de Propósito Divino. Essas situações
contam com a "inércia do Universo" para a sua manifestação, são os
mundos paralelos te auxiliando com Sincronicidades e te dizendo que aquele é um
caminho certo e que você não precisa fazer tanto esforço assim para trilhá-lo
por que ele já estava te esperando; você pode ter situações que não são tão
consonantes com sua essência, não estão tão adequadas ao seu propósito, mas
compõem uma parte importante do seu desenvolvimento e o seu Querer é suficiente
para trazê-las à tona, então você empregará um pouco mais de energia vital
naquele ato de Vontade para a consecução mágicka. Significa que os breves
lapsos de livre-arbítrio que nós temos aqui no plano físico nos permitem
remodelar cenas secundárias da nossa trajetória (eu não vou entrar aqui na
discussão de livre-arbítrio x predestinação, mas eu acredito que ambos são
possíveis e, inclusive, complementares). Há ainda uma terceira situação em que
um sigilo é utilizado para propósitos completamente fúteis e intimamente
desligados daquele Caminho pelo qual o magista deve percorrer. Esses sigilos
vão exigir muita energia vital do aplicante, por que é como se você colocasse
uma força em contraposição com uma correnteza e você tivesse que ser teimoso -
e não "persistente" - para alcançar o seu desejo - e não
"Vontade". Essa é a causa mais comum de falhas com sigilos, é a magia
por curiosidade, é a frivolidade do novato ou a insensibilidade do desalinhado
consigo mesmo.
Magia
é a espontaneidade com que nossos espíritos se manifestam! Conforme o magista
vai se reformando integralmente o sigilo deixa de ser uma tarefa racional e
acaba por se tornar apenas uma formulação de Vontade, o mago não precisa glifar
seu propósito, apenas pensar nele. A harmonia com seu caminho já é tanta que
ele já não divaga tanto em suas intenções, ele sabe o que é conveniente e o que
não é, ele sabe o que é o Querer e o que são apenas desejos quaisquers, seus
atos são a expressão de sua superioridade e, portanto, são férteis e completos
em si.
Às
vezes é difícil engolir esse conceito de Propósito Maior, esse papo de evolução
e superar-se. É muito difícil discutir isso dentro da Magia do Caos que acaba
por assumir, infelizmente, um viés de inconsequência e descontrole que a
juventude tanto clama. Aparte desse conceito, portanto, devo dizer que ele não
é o único fator para o sucesso de um sigilo. Outro aspecto essencial o qual
muita gente não se dá conta é a qualidade energética do magista. Para se
aplicar energia em algo é preciso tê-la disponível em si.
Uma
vez eu tive contato com um magista que afirmava que seus sigilos não davam
certo nunca e que ele não sabia se estava fazendo algo errado. Após revisar a
técnica dele constatamos que estava tudo certo, então eu lhe perguntei se eu
podia fazer uma varredura energética em seu corpo, a qual ele consentiu. O
rapaz estava extremamente desvitalizado e a isso ele me respondeu estar num
princípio de depressão. A qualidade de sua energia era tão baixa, seu chakra
básico estava tão prejudicado, que eu não via como uma pessoa em estado de
subnutrição prânica pudesse se valer de qualquer reserva energética para
manifestar a intenção que fosse por meio de um sigilo. Os trabalhos mágickos,
mesmo os mais simples como sigilos, exigem extrema DISPOSIÇÃO. É preciso estar
no controle de si e da situação para se remodelar a realidade de forma conveniente,
de outra forma os resultados podem ser dúbios e dissonantes, inconvenientes. Eu
aconselhei o rapaz a se tratar, aprender reiki ou outras formas de imposição de
mãos, alguma técnica que lhe desse um pouco mais de autonomia energética para
então se valer dos sigilos.
O
sigilo é simples, ele TEM de ser simples. O que há de complexo é o contexto
oculto que os envolve. Há inúmeras formas de aperfeiçoar nossos sigilos,
inúmeras maneiras de tornar os resultados mais acertivos e imediatos, maneiras
de converter planos em espontaneidade e frieza na verdadeira magia. Tomar as
rédeas de nosso Ser nos delegará responsabilidades que até então não tínhamos,
mas nos conferirá liberdades inimagináveis e experiências incomparáveis. Em
síntese, tornamo-nos incompreensíveis aos desnecessários.
M:
Sei que já respondeu parcialmente na questão passada, agora, por favor, detalhe
mais. Você considera que existe uma ou mais teorias/modelos que explica(m) como
os Sigilos Mágickos funcionam? Se sim quais modelos/teorias? Como elas explicam
esse funcionamento?
R:
A questão de teorizar
a magia é delicada. O sigilo, a meu ver, é um mecanismo simples, antiquíssimo,
usado desde sempre pelo homem, na sua maioria das vezes de forma inconsciente,
e talvez até por isso, eficaz.
Dentro
da Magia do Caos há os sistemas individuais e os de massa. Há os escritores e
magos mais experientes que divulgam seus aprendizados e técnicas e há os
neófitos e estudantes que adaptam os ensinamentos da forma como lhes convém. Eu
acho que a Magia do Caos é muito prática e é uma espécie de magia conveniente.
Nem tudo funciona, mas tudo está aberto a ser testado, então por isso os
novatos no campo da metafísica se fascinam com o campo de exploração que esta
egrégora permite.
Eliphas
Levi, em seu Grande Arcano, diz que uma oração sincera e feita com fé é mais
potente do que um ritual salomônico e eu não lhe tiro a razão. É claro que
devemos pesar as finalidades e a quantidade de energia empregue, no entanto
tudo se resume na questão de direcionamento e intensidade da Vontade do
magista. Eu acho que o sigilo é isso, é o investimento da intensão sobre um
desejo, às vezes fantasiado, às vezes cru.
Eu
vejo várias técnicas em livros de espiritualidade de autoajuda que propõem a
concentração numa situação que se ambiciona antes de dormir, afirmando que há
um estado de semi-consciência que nos conecta ao campo de potencialidade pura.
Este estado é a GNOSE do magista do caos, é o mesmo que se faz ao lançar um
sigilo. Quando se tem intimidade com o divino não é preciso estar no limiar do
sono, não é preciso masturbação, não é preciso postura de morte e nem mesmo o
glifo, o símbolo em si, mas apenas a Vontade pura e concentrada. É por isso que
eu digo que os homens vêm fazendo isso desde sempre, a magia é de sua natureza.
Quantas vezes os adeptos, ao entenderem os mecanismos da realidade, não olham
para situações de seu passado e as compreendem com mais clareza, surpresos pro
já exercerem de forma espontânea o que agora os fascina o entendimento.
O
caminho do meio é a conciliação da espontaneidade com a consciência. Não há
técnicas, não há sistemas, não há egregoras, não há meio, é o ser consigo
mesmo, o equilibrar das experiências.
M:
Ainda não falamos mais detalhadamente sobre o esquecimento no processo de
Sigilos Mágickos. Para você precisamos esquecer algo para o Sigilo funcionar?
Comente um pouco sobre esse tema.
R: Então, o esquecimento NÃO É
obrigatório. Um sigilo ópera de diversas formas: há quem opte por utilizá-lo
por meio de reforço visual e faz uma ancoragem de um intento ao símbolo e
frequentemente encara o símbolo como meio de energizar aquele link energético.
É o que as marcas fazem.
Outras
pessoas preferem o prático carregar-e-descartar, e então esquecem e desapegam. O
esquecer é, geralmente, para o neófito que não dá conta de controlar sua
ansiedade. As teias mentais de autossabotagem impediriam o desenvolvimento
pleno do sigilo caso o magista se pegasse pensando o tempo todo em como o
cosmos operaria e "será que vai dar certo?!", entre outras
inseguranças.
Esquecer
não é necessário, isso é dogma.
M:
Para você, existe alguma vantagem do método de Sigilização em relação à outros?
Se sim, quais vantagens? De quais outros métodos?
R: Eu entendo o método de sigilização como
uma forma prática de se utilizar a magia. Eu vejo a Magia do Caos em geral como
uma ferramenta própria da pós-modernidade, um sistema extremamente empático e
flexível que possibilita aos praticantes um domínio do sutil sem que estes
tenham de se aprofundar em dogmas ou crenças fixas.
O
sigilo é empoderador, ele garante acessibilidade à metafísica, é uma técnica
que permite qualquer estudante com um pouco mais de atenção e curiosidade
explorar aspectos da realidade que antes se mostravam invisíveis e intangíveis
a ele.
Mas,
ao mesmo tempo que a Magia do Caos permite essa exploração crua, ela tende a
formar arrogantes e inconsequentes, por que a autonomia que essa nossa
pós-modernidade nos outorga se converte numa síndrome de independência e apatia
que vicia os indivíduos no próprio individualismo. Esse acesso repentino às
diversas possibilidades (do Louco ao Mago), diferente de outros sistemas de
discipulado em que o estudante recebe um preparo para lidar com ferramentas
amplas, pode vir a fazer mais mal do que bem. Excentricidade, niilismo
sintomático, ateísmo, todas essas características que são comuns na baixa
magia, mas que são o oposto da Grande Obra podem vir a acometer aqueles
estudantes que descuidam de si ao lidarem com um poder inesperado.
Para
mim, portanto, a sigilização como qualquer outra coisa tem suas vantagens e
desvantagens cabendo ao praticante o bom senso de mensurar-se e estudar a si
próprio para não se perder nos caminhos.
M:
Explorando possibilidades: caso se faça um Sigilo Mágicko com base em um Frase
de Intento e se tire dela, vamos dizer, as letras repetidas, daí cria-se o
glifo ou mantra. No entanto se ao tirar as letras repetidas você e acaba
tirando, inconscientemente, uma ou mais letras não repetidas, quero dizer,
o Sigilo funcionará? Explicando melhor, quando vou preparar um Sigilo Mágicko,
escrevo a Frase de Intento e tiro as letras repetidas riscando-a
completamente a letra, que fica ilegível, contudo corro o risco de
riscar/eliminar letras para mais, sem perceber. Peço que desenvolva uma
hipótese para esse este experimento.
R:
Os sigilos não têm
fórmulas específicas. Essa técnica de cortar letras é apenas uma técnica
possível. Tudo isso e apenas para criptografar a mensagem antes de enviá-la
para o seu subconsciente. Da mesma forma poderia ser usado Zenit Polar, código
Morse ou mesmo o sistema de gematria hebraico. Aliás, os sigilos angelicais de
invocações angélicas do hermetismo têm a mesma função de um sigilo caoísta, os
primeiros encerram a essência de uma consciência e estes últimos encerram em si
a essência de uma intenção.
Uma
letra a mais ou a menos, contanto que você não perca a confiança no que está
fazendo, não faz diferença alguma!
M:
Você tem alguma(s) dica(s) para se trabalhar com Sigilos?
R:Tenho. Muita gente se sente preso ao
formalismo do ritual, acreditando que a técnica de sigilização pertence à
egregora da Magia do Caos e que é necessário um passo a passo para se chegar no
resultado final. Não é preciso.
A
Magia do Caos lida exatamente com a imprecisão, a possibilidade de criar novas
realidades e o experimentalismo nas operações de seu próprio espírito. A
egregora tem uma veia DIY* muito forte e essa é a maior oportunidade de
emancipação da consciência e da vivência do TAO, da espontaneidade, dentro do
ocultismo ocidental. A questão que trato aqui é a de que o sigilo é um
desdobramento NATURAL dos desejos desapegados do operador. Olhe para trás de
si, na sua infância, quantas vezes você não obteve sucesso apenas por Querer?
O
que eu quero dizer é que com quanto mais desapego o magista tratar suas
intenções, menos formalismo será empregue e consequentemente, mais ele vai ter
espaço para expressar sua verdadeira essência e energizar aquele desejo e é
isso que faz a manifestação certeira. Chega-se a um ponto, portanto, que
torna-se desnecessário escrever as intenções num papel ou formular mais do que
um desejo para que ele se manifeste espontaneamente. E com essa maturidade,
claro, deixa-se de desejar as futilidades para dar-se vazão ao que realmente importa.
A
síntese dessa verborragia é o mote oculto dos caoístas: relaxe e goze.
M:
Você tem alguma recomendação(ões) de livros, sites, enfim, fontes de
informações sobre Sigilos?
R:
Eu recomendo tudo do
Phil Hine, tudo do Peter Carrol, o "Pop Magic!" do Grant Morrison e o
"Teoria dos Sigilos" do Austin Osman Spare. Além disso recomendo o
grupo de Facebook "Kaos Brasil - Magia do Caos". Acho que esses
autores renomados têm mais propriedade e, principalmente, maturidade para
tratar do assunto. Nos blogs a gente encontra muito material que além de
insustentável é também perigoso para os neófitos. A internet é uma selva quando
se Trata de magia do Caos.
M:
Dê um feedback de como foi para você a Entrevista.
R:
Eu adorei a
entrevista! Foi bem agradável e acho que cercamos bem o tema, embora, como
dissemos, há uma diversidade de maneiras de se praticar esta técnica e não
conseguiríamos - e seria desinteressante - abordar todas elas aqui.
Acho
que eu tenho um posicionamento bem diferente da maioria dos estudantes de Magia
do Caos quando eu prezo por responsabilidade e por uma espécie de moral que nem
sempre está presente no ethos destes magista. A meu ver este contraponto é
crucial para que o neófito possa balancear seus pontos de vista e suas
atitudes.
Espero
que este trabalho possa esclarecer dúvidas e levar o entendimento ao buscador
sincero. Sou grato por participar deste projeto.
*”Do
It Yourself” (expressão em inglês que significa: “Faça Você Mesmo”).
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